Camila de Brito Quadros Lara
(Doutoranda em História pela Universidade Federal
da Grande Dourados- PPGH/UFGD. Bolsista Capes – DS).
Resumo:
Esse
texto tem como objeto de estudo a Feira Livre de Dourados, criada em 1948
através do Decreto Lei nº 19, como uma estratégia de abastecimento dos
moradores da cidade, comercialização dos produtos hortifrutigranjeiros dos
colonos da Colônia Agrícola Nacional de Dourados (CAND) e da Colônia Municipal
de Dourados (CMD), bem como forma de arrecadação de impostos para o município.
Nesse sentido, a Feira Livre teve como seu primeiro ponto de localização a
Praça Antônio João. Porém, durante as décadas, sua localização foi alterada algumas
vezes pelo poder público, até ser instalada no Jardim São Pedro, local atual.
Diante desse contexto, esse texto tem como objetivo apresentar e discutir
alguns aspectos históricos da Feira Livre de Dourados, sobretudo, na perspectiva
das memórias sobre/da cidade, tentando refletir sobre o processo de interação
dos moradores da cidade e das colônias, o entendimento da Feira Livre enquanto
espaço de trocas comerciais e simbólicas, a visão e o interesse do poder
público em relação à feira, além do desenvolvimento econômico de Dourados, tão
pautado no progresso e na modernidade, discurso bastante utilizado pela
imprensa local e pelos memorialistas. Entender a Feira Livre de Dourados
enquanto elemento representativo diante do reordenamento do espaço público, bem
como suas dinâmicas e representações sociais e culturais também se faz
necessário, pois a feira se constitui em um espaço de sociabilidade, de
trabalho, de lazer, de tradição e de memória coletiva, produzindo identidades.
Sua representação está para além das funções econômicas, visto que se trata de
uma produção cotidiana de saberes, de práticas sociais e culturais, de relações
de poder. As fontes trabalhadas nessa pesquisa constituíram-se pelos relatos
contidos em produções memorialísticas, produções acadêmicas sobre as relações
da cidade com o objeto pesquisado, além de fontes de imprensa.
Introdução:
migração e memórias da cidade
O contexto histórico do
povoamento não índio no extremo sul do antigo Mato Grosso foi marcado por
alguns processos migratórios os quais originaram, mais tarde, o município de
Dourados. A ocupação e o povoamento da região iniciaram-se no final do século
XIX e início do século XX com a chegada dos primeiros migrantes vindos,
sobretudo, dos estados de Minas Gerais, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul.
Tais migrantes, ao adentrarem a região, tinham como intenção principal iniciar
uma “nova vida” com o trabalho na terra, pois essa localidade representava
naquele momento um “lugar onde as terras mais recompensassem aos trabalhos da
lavoura” (O Douradense, 02/12/1948,
p. 1).
Mais tarde, com o
advento da Marcha para o Oeste[1],
o então sul do estado do antigo Mato Grosso passou por transformações sociais,
econômicas e paralelamente, transformações culturais, devido ao intenso
processo de povoamento e ocupação ocorrido na região no final da década de
1940, cujos desdobramentos têm relação direta com a Feira Livre de Dourados.
Neste contexto, foi criada, em 1943, a Colônia Agrícola Nacional de Dourados –
CAND, cuja efetivação iniciou-se em 1948, recebendo migrantes procedentes de
várias partes do Brasil. Em relação ao processo de migração, Ponciano (2006)
constata que na verdade, ocorreu
[...] uma verdadeira
avalanche de migrantes chegando à CAND e estas famílias que iam chegando, em
condições precárias, posto que eram em sua maioria, famílias pobres e excluídas
do sistema político-econômico que se implantava nos grandes centros do Brasil,
como o Rio de Janeiro e São Paulo, eram orientadas a estabelecer-se,
provisoriamente, em terrenos da administração da Colônia, no local onde se
situa atualmente Vila São Pedro, distrito de Dourados, localizada na saída para
Rio Brilhante [...] (PONCIANO, 2006, p. 94).
Nesse sentido, após a iniciativa do
governo federal, outras colônias agrícolas também são fundadas a nível estadual
e municipal e, dentre elas, a Colônia Agrícola Municipal de Dourados – CMD. A
CMD foi implantada pelo município de Dourados, no final do Estado Novo
(1937-1945), no território que atualmente corresponde a uma parte do município
de Itaporã (CARLI, 2008). Lembrando que, com a chegada dos migrantes, o
processo de variedade e complexidade social e cultural em Dourados ficou ainda
mais acentuado. Ernandes (2009) cita também a chegada e permanência de
imigrantes, a exemplo, japoneses e sírio-libaneses, os quais também colaboraram
para o multiculturalismo local, sendo que, dessa forma: “Temos, portanto, etnias
e nacionalidades diferentes negociando seus códigos e comportamentos culturais
e suas dinâmicas de trabalho” (ERNANDES, 2009, p. 73). Sabe-se que os japoneses
se instalaram na CAND e os sírio-libaneses dedicaram-se, sobretudo ao comércio
na área urbana. Vale salientar que o imigrante paraguaio também é citado por
João Augusto Capilé Junior, na edição nº 13 do jornal O Douradense, o qual afirma que os primeiros se instalaram na
região em 1901 (O Douradense,
02/12/1948, p. 1).
A
importância da CAND para história de Dourados: a gênese da Feira Livre
A
CAND possuía grande capacidade produtiva, a qual era destinada ao abastecimento
da região Sudeste do país, como também parte da produção era comercializada nos
arredores de Dourados, além de servir à subsistência dos colonos. Dentre os
gêneros agrícolas produzidos, destacavam-se as culturas de algodão, café e
amendoim com foco comercial e as de milho, arroz, feijão, mandioca, trigo, alho
e cana para a subsistência (MENEZES, 2012). Já na CMD, além de praticamente as
mesmas culturas produzidas na CAND, havia em menor proporção, as lavouras de
alho, cebola, melancia, banana, abóbora, batata doce, abacaxi, fumo e trigo
(CARLI, 2005). Por outro lado, Menezes (2012) e Carli (2005) referem-se às
perdas da produção de alimentos, sobretudo por falta de equipamentos para
armazenamento e as dificuldades no transporte, devido às más condições das
estradas.
Nesse sentido, no final da década de
1940 inicia-se uma espécie de campanha para a instalação de uma Feira Livre em
Dourados, sendo essa campanha encabeçada por Armando da Silva Carmello, diretor
e proprietário do jornal O Douradense
e, além disso, ocupava o cargo de Secretário da Associação Comercial e
Secretário Interino da Prefeitura.
Ao
que parece, a criação da feira obedeceu ou fez parte de um planejamento do
poder público para o município, de acordo com a Lei nº 74, de 13 de dezembro de
1947. O fato é que em 15 de julho de 1948 o então prefeito municipal, Antônio
de Carvalho, popularmente conhecido como Carvalhinho,
cria através do Decreto Lei nº 19 a Feira Livre de Dourados, sendo tal
documento publicado no jornal O
Douradense em 11 de setembro de 1948. De acordo com o referido Decreto Lei,
alguns aspectos foram considerados:
Considerando que a necessidade imperiosa
de incrementar o aumento de produção por parte dos colonos disseminados pelo
município; Considerando que a referida produção já é considerável e merece
desse executivo municipal toda a sua iniciativa em sua venda em mercados
próximos; Considerando que, do intercâmbio comercial entre os colonos e o
comércio local, resultará o aumento das rendas municipais; Considerando ainda
que da criação de mercados ou feiras livres a população local será melhor
atendida dos produtos de primeira necessidade e com preços mais vantajosos,
como sejam aqueles que naturalmente serão tabelados e fiscalizados por esta
Prefeitura (O Douradense, 11/09/1948,
p. 4).
Percebe-se que, para
além das questões de comercialização da produção ou dos excedentes das colônias
agrícolas e uma possível estratégia para o abastecimento de gêneros
alimentícios aos moradores da cidade, havia o interesse de arrecadação de
impostos para o município, ficando os feirantes, conforme a publicação, isentos
do pagamento até o final do referido ano, sendo esta isenção, pelo menos
aparentemente, uma motivação para a adesão dos colonos.
O Decreto Lei ainda
menciona que a Feira Livre ficaria localizada “possivelmente na praça reservada
para o Grupo Escolar de Dourados” (O
Douradense, 11/09/1948, p.4). De fato, a primeira feira ocorrida na cidade
foi em um domingo pela manhã, no dia 15 de agosto de 1948 na Praça Antônio
João. Tal fato foi noticiado pela imprensa local que o retratou como
“espetáculo bastante animador” e apresentou as percepções de três personagens
locais: Sr. Milton Sá Santos (Presidente da Associação Comercial de Dourados),
Sr. Armando Campos Belo (comerciante e político) e Sr. Argot Anderson
(visitante). Os três homens elogiam o prefeito pela criação da feira, exaltam o
“progresso e a grandeza” de Dourados
enquanto centro agrícola, a que chamam de “Terra de Promissão”. De acordo com a
publicação, a feira não faria concorrência com o comércio local, pois
comercializaria artigos necessários para o cotidiano das pessoas, ou seja,
galinha, ovos, verduras, frutas, carne de porco e peixe. Além disso,
favoreceria o comércio local, na medida em que, de certa forma obrigaria os
colonos a comprarem mercadorias de outros gêneros para abastecerem suas
famílias e suas lavouras (O Douradense,
17/08/1948, p.1). Nesse contexto, nota-se claramente como se iniciava um
processo de trocas comerciais que, aos poucos, derivaram outros tipos de
relações sociais entre colonos e moradores da cidade.
Desse
modo, a feira torna-se um dos principais locais de trocas em Dourados, onde os colonos
levavam suas mercadorias para vender e paralelamente abasteciam-se com produtos
que não possuíam, através do bolichos
que havia na cidade. Dessa forma, considera-se importante pesquisar a Feira
Livre de Dourados enquanto espaço, não somente em sua vertente geográfica com
suas mudanças através das décadas, mas também em sua constituição social e
cultural. Nesse sentido, Araujo (2011), ao analisar em sua tese as feiras do
Brasil e de Portugal, aponta que
[...] a feira é
considerada espaço de ‘pobre e de sujeira’, o qual, desde sua formação, sempre
foi visto como ‘[...] lugar de marginais, de prostitutas, de jogadores,
saltimbancos, ladrões e mendigos’. Entretanto, contrariando essa concepção
preconceituosa, nos dois lados do Atlântico, desde os primórdios, foi montada
uma estrutura administrativa no entorno das feiras como forma de controle e
lucro por parte do Estado, o que evidencia a importância que tais instituições
sempre tiveram (ARAUJO, 2011, p. 30).
Essa
afirmação nos leva a comparar as constatações da autora com o cenário de
Dourados, nos levando a algumas reflexões, sobretudo no que diz respeito a
apropriação do espaço material e simbólico da feira, as disputas de poder que
são demandadas, os sentidos e significados presentes nas representações da
Feira Livre de Dourados, dentre outros aspectos relevantes. Contribuindo com a
questão dos sentidos e significados das relações dos espaços da cidade,
Pesavento (2007) aborda em seu texto “Cidades visíveis, cidades sensíveis,
cidades imaginárias” as representações que o historiador busca recuperar. Para
a autora,
A cidade sensível é aquela
responsável pela atribuição de sentidos e significados ao espaço e ao tempo que
se realizam na e por causa da cidade. É por esse processo mental de abordagem que o
espaço se transforma em lugar, ou
seja, portador de um significado e de uma memória; [...] que criamos as
categorias de cidadão e de excluído para expressar as diferenças
visíveis e perceptíveis no contexto urbano fazendo com que se criem novas
identidades a partir do gesto, do olhar e da palavra que qualifica; que falamos
de progresso ou de atraso, que distinguimos o velho do antigo; [...] (PESAVENTO, 2007, p. 15, destaques da autora).
Os espaços ocupados pela Feira Livre: a
dinâmica da cidade e suas memórias
A memória certamente é
uma fonte profícua para o historiador, sendo a mesma entendida como a
capacidade que o ser humano tem de relembrar e conservar experiências e
informações relacionadas ao passado, sendo estas, parte de processos de
interação de cada indivíduo com seu meio. Pesavento (2008) introduz esse
sentido no campo de pesquisa das cidades quando afirma que “uma cidade possui seus
mitos, suas lendas, suas histórias extraordinárias, transmitidas de boca em
boca, de geração em geração, através da oralidade” (PESAVENTO, 2008, p. 7).
A Feira Livre de
Dourados não permaneceu na Praça Antônio João por muito tempo, sendo que
funcionou em vários locais da cidade. Venâncio (2014) relata as memórias de sua
mãe sobre a feira, em seu livro Dourados
e sua Cultura, fruto da compilação de vários artigos publicados em sua
coluna na Folha de Dourados:
Era dezembro de 1952, minha mãe a
pouco havia se mudado para Dourados quando foi informada que defronte a casa da
família Kanashiro, que ficava na Avenida Presidente Vargas, realizava-se aos
domingos uma feira-livre. Minha mãe então preparou uma cesta com pastéis e
mandou que meu irmão Irlian a levasse até a feira para serem vendidos. Contava
a minha mãe que a venda não foi das melhores e que o guardanapo de tecido bem
branquinho que cobria os pastéis ficou vermelhinho de poeira [...] (VENÂNCIO,
2014, p. 54).
O
autor ainda relata que mais tarde a feira foi transferida para a Rua Dr. Nelson
de Araújo, entre a Avenida Marcelino Pires e Rua Rio Grande do Sul, atual
Weimar Gonçalves Torres. Nesse caso, as memórias do autor referem-se aos doces
que marcaram sua infância e que eram vendidos na feira.
Ela [a feira] começava em frente
a casa de Dona Quinha, uma professora que lecionava no Grupo Escolar Joaquim
Murtinho, e que ficou muito conhecida pelos pirulitos, feitos com açúcar, mel
de abelha e limão. Tinha um sabor muito especial que só de lembrar, me dá água
na boca. Os pirulitos eram feitos em tabuleiro de madeira e faziam muito
sucesso com as crianças (VENÂNCIO, 2014, p. 54).
Depois de um tempo, a
feira foi transferida para a Rua Santa Catarina, atual Onofre Pereira de Matos,
entre as ruas Presidente Vargas e João Rosa Góes. Devido à falta de espaço para
o seu crescimento, foi então transferida para a Rua Cuiabá, onde permaneceu por
mais de 30 anos (VENÂNCIO, 2014, p. 55).
Diante dos relatos de
memorialistas, podemos entender que a memória também pode ser utilizada para
reconstruir os fatos históricos do passado, a partir de ressignificações
individuais. Nessa perspectiva, a ressignificação da memória é constante.
Santos (2003), ao estudar os nordestinos em Dourados, abordou através de suas
fontes, algumas memórias relativas à feira. Sua interlocutora, Dona Lindalva,
que chegou a Dourados em 1960, assim diz sobre o trabalho na feira.
De
carroceira pra cima eu fui. Aí eu vim lá pra rua Cuiabá fiquei nove anos lá com
o bolichinho, só podia tocá bolicho (é uma mercearia de bairro que vende
produtos como arroz, feijão, açúcar, óleo e outros gêneros alimentícios e de
limpeza) porque outra coisa eu não podia fazê né... trabalhava na feira quando
era no meio da semana quando chegava da feira no domingo já vinha com treis,
cinco encomenda de pó-de-serra naquele tempo não tinha fogão a gás, [..] tinha
dez metro de barraca coberto na feira (apud SANTOS, 2003, p. 98).
Interessante mencionar
que mais recentemente, no dia 26 de novembro de 2016, a Feira Livre de Dourados
novamente tem seu local alterado, passando agora a se estabelecer de “forma fixa” no Jardim São Pedro,
sendo denominada Espaço Feira João Totó
Câmara, numa homenagem ao ex-prefeito de Dourados que exerceu dois mandatos
(1967-1970 e 1974-1977).
Atualmente
Dourados possui várias feiras espalhadas por alguns bairros e que funcionam
durante a semana. Além do Espaço Feira Central, BNH´s I e II Plano, Parque
Alvorada, Izidro Pedroso, Vila Vargas, Praça do Cinquentenário, Jardim Flórida
e a Feira Agroecológica do Parque dos Ipês (O
Progresso, 24/11/2016).
Essa diversidade de
espaços, as formas como os mesmos foram
utilizados e estabelecidos geograficamente e na perspectiva do planejamento
urbano, e além disso, a constante (re)apropriação desses espaços por moradores,
feirantes e visitantes me instiga a analisar e problematizar esses contextos
que são, além de diversos, complexos, pois têm desdobramentos nos âmbitos
econômico, social, cultural, dentre outros, que conferem a esse espaço uma
dinamicidade e sociabilidade, na medida em que “ela comporta atores, relações
sociais, personagens, grupos, classes, práticas de interação e de oposição,
ritos e festas, comportamentos e hábitos (PESAVENTO, 2007, p.14).
A feira é o local em
que as sociabilidades se manifestam em todas as suas dimensões, sendo na rua
que elas se expressam com maior intensidade. Inúmeras são as pessoas que se
deslocam semanalmente para os núcleos urbanos, oriundos da zona rural ou mesmo
de outros centros urbanos, transformando a feira numa efervescência social,
caracterizada por uma multiplicidade de sujeitos, com variados eventos,
modificando, ainda que por um período curto, a temporalidade da cidade e
imprimindo um dinamismo diferente do rotineiro, do habitual (ARAUJO, 2011, p.
90-91).
Diante dessa dinâmica
moradores x espaços, é possível também pensar a Feira Livre de Dourados
enquanto elemento do contexto urbano, que direta ou indiretamente interfere na
imagem da cidade, na medida em que, com o passar do tempo, migra para
diferentes espaços, determinando também, diferentes significados “que se
constroem mas também se modificam pelas experiências e vivências sociais
posteriores, exprimindo diferentes temporalidades” (FENELON, 1999, p. 6). E
nesse sentido, para a autora,
Isso se concretiza a partir de
uma concepção que busca captar e investigar, nas relações sociais instituídas
na cidade, o entendimento de modos de viver, de morar, de lutar, de trabalhar e
de se divertir dos moradores que, com suas ações, estão impregnando e
constituindo a cultura urbana. Assim agindo, esses moradores deixam registradas
ou vão imprimindo suas marcas no decorrer do tempo histórico, marcas que
traduzem a maneira como se relacionaram ou construíram seus modos de vida neste
cotidiano urbano (FENELON, 1999, p. 6).
Considerações
Finais
Ao considerarmos as
questões relativas as memórias e a história dentro do campo das cidades, é
interessante nos voltarmos para a intencionalidade de construção de
historicidades, de representações e identidades de grupos sociais e que são
permeadas pelas relações de poder. A história das colônias agrícolas que se
desenvolveram nessa região, bem como a Feira Livre enquanto um produto
histórico, social e cultural delas, perpassa a história de Dourados e demonstra
o caráter multicultural que se formou nesse cenário.
Pensando a feira no
contexto urbano douradense, além de se compreender e refletir sobre a
historicidade da feira e seus desdobramentos, há de se salientar que ao longo
dos anos, foram criadas outras feiras nos bairros de Dourados a fim de atender
aos moradores das proximidades, incrementar os ganhos dos feirantes, gerar
renda para o município, e de certa forma, esse procedimento também foi criando
uma identidade vinculada ao espaço ocupado pela feira, suas características
próprias, o dia da semana em que ela foi estabelecida, além do bairro em que
está localizada, a relação com os moradores do entorno, dentre outros aspectos
relevantes.
A temática dos espaços
que a Feira Livre ocupou em Dourados e a forma como o poder público tratou
dessa questão me parece importante, na medida em que aparentemente e de acordo
com algumas conversas informais com frequentadores, a feira foi, aos poucos,
deixando o espaço urbano central e ocupando gradativamente, as margens da
cidade. Na verdade, sabe-se que tais mudanças relativas à localização da feira
em uma cidade são estratégias do poder público diante do planejamento urbano e
que em determinados locais uma feira não é “bem vista”, a exemplo da feira que
funcionou por um período próximo ao Fórum de Dourados.
Entender a Feira Livre de
Dourados enquanto elemento representativo diante do reordenamento do espaço
público, bem como suas dinâmicas e representações sociais e culturais também se
faz importante, pois a feira se constitui em um espaço de sociabilidade, de
trabalho, de lazer, de tradição e de memória coletiva, produzindo identidades.
Sua representação está para além das funções econômicas, visto que se trata de
uma produção cotidiana de saberes, de práticas sociais e culturais, de relações
de poder.
Nesse sentido, os
estudos vinculados aos aspectos sociais e culturais das feiras e, nesse caso,
da Feira Livre de Dourados são fundamentais para compreender não somente os
aspectos econômicos, mas sobretudo as relações e demandas da cidade e dos
sujeitos que vivem e atuam nesse cenário, mostrando mais uma das facetas das variadas
memórias produzidas e vivenciadas.
Referências
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Jornal O Progresso
Jornal O Douradense
[1] Trata-se de uma
política administrativa do governo Getúlio Vargas que visava intensificar o
povoamento da região Centro Oeste. Tal política exerceu influência direta para
que ocorresse uma onda de migração de várias regiões do país para o sul de Mato
Grosso (SANTOS, 2007). Tinha como objetivo promover a ocupação dos espaços
considerados vazios. Além disso, era
“revestida de grande aparato propagandístico, apresentava ao povo brasileiro a
colonização como chave para o desenvolvimento econômico e a conquista total do
território” (SANTOS, 2007, p. 23).
O cotidiano da feira livre é um convite a um ambiente repleto de diversidade de produtos alimentícios e de pessoas. Os feirantes arrumam suas bancas para oferecer aos seus fregueses o que há de melhor. Nesse ambiente, se dá a circulação de produtos e pessoas, e as relações do dia a dia, entre todos que fazem parte desse espaço (feirantes e fregueses). Nesse sentido, todos são sujeitos sociais que desempenham papéis diferentes e atuam significativamente na construção da identidade local. No sentido de contribuir com a pesquisa, recomendo a leitura da obra "Feira Livre: Organização, trabalho e sociabilidade", de Leny Sato (2012).
ResponderExcluirOlá professora Lêda, bom dia!
ExcluirPrimeiramente agradeço a disponibilidade em ler e comentar sobre meu texto, além da preciosa indicação de bibliografia. Anotei a dica! Esse texto faz parte do meu projeto de tese que pretende apontar a relação da cidade com o patrimônio cultural tombado, nesse caso, a Feira Livre de Dourados. Nesse sentido, pensar os sujeitos sociais inseridos nesse processo - feirantes, poder público, morador do entorno tombado e frequentador da feira - é fundamentar para se discutir o papel e a relação do meu objeto de pesquisa com as memórias da cidade. Novamente agradeço a contribuição. Um abraço.
Camila de Brito Quadros Lara - PPGH/UFGD.
O cotidiano da feira livre é um convite a um ambiente repleto de diversidade de produtos alimentícios e de pessoas. Os feirantes arrumam suas bancas para oferecer aos seus fregueses o que há de melhor. Nesse ambiente, se dá a circulação de produtos e pessoas, e as relações do dia a dia, entre todos que fazem parte desse espaço (feirantes e fregueses). Nesse sentido, todos são sujeitos sociais que desempenham papéis diferentes e atuam significativamente na construção da identidade local. No sentido de contribuir com a pesquisa, recomendo a leitura da obra "Feira Livre: Organização, trabalho e sociabilidade", de Leny Sato (2012). Por: Profa. Lêda Rodrigues Vieira.
ResponderExcluirOlá professora Lêda, bom dia!
ExcluirPrimeiramente agradeço a disponibilidade em ler e comentar sobre meu texto, além da preciosa indicação de bibliografia. Anotei a dica! Esse texto faz parte do meu projeto de tese que pretende apontar a relação da cidade com o patrimônio cultural tombado, nesse caso, a Feira Livre de Dourados. Nesse sentido, pensar os sujeitos sociais inseridos nesse processo - feirantes, poder público, morador do entorno tombado e frequentador da feira - é fundamentar para se discutir o papel e a relação do meu objeto de pesquisa com as memórias da cidade. Novamente agradeço a contribuição. Um abraço.
Camila de Brito Quadros Lara - PPGH/UFGD.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirOlá, boa tarde.
ResponderExcluirCamila, parabéns pelo trabalho!
Gostaria de saber se pretende trabalhar história oral considerando os sujeitos do processo, em especial, os feirantes e clientes da feira? Nesse sentido, já efetuou alguma entrevista?
Atenciosamente, Daiane Lima dos Santos
Olá Daiane, obrigada pelo comentário. Sim, no projeto da tese está prevista a utilização de fontes orais, sobretudo no que diz respeito aos feirantes. As entrevistas fazem parte da próxima fase da pesquisa e ocorrerão ainda nesse semestre. Desejo sucesso em sua pesquisa!
ResponderExcluirAbraço!
Camila de Brito Quadros Lara- PPGH/UFGD.
Olá, Camila!
ExcluirObrigada e desejo o mesmo para sua pesquisa!
Forte abraço!
Daiane Lima dos Santos
Parabéns pelo trabalho!! Em alguns momentos você menciona sobre as representações sociais e culturais da Feira. gostaria de saber como você trabalha esse conceito, de Representação?
ResponderExcluirOlá Shirley, obrigada pela contribuição. Pretendo trabalhar as questões relacionadas à representação a partir de Chartier entendo-a enquanto instrumento de análise a partir da história cultural. Nesse sentido, as relações de poder também se revelam importantes nessa análise.
ExcluirCamila de Brito Quadros Lara- PPGH/UFGD.